Hoje é dia de Sambada (CD independente, sem incentivo público, nem apoiadores, já
disponível nas plataformas digitais), álbum com coco de roda e beats eletrônicos do
poeta, compositor e percussionista pernambucano DMeloCoco. Nascido no Recife, em
1983, e criado em Camaragibe, DMelo achegou-se ao coco desde sua infância em Bom
Jardim, cidade do Agreste pernambucano. Para que tenham noção do calibre do cara,
digo-lhes que DMelo tem o coco nas veias e com ele consegue contaminar as veias
alheias (dessa percepção vem o título deste texto); e que, desde 2016, ele integrou e
colaborou com vários grupos da cena musical e cultural independente, como o
Menestréis Cantador e o Coco dos Capoeira, dentre outros.
Em Sambada, ouve-se e atenta-se para a importância do coco, gênero musical
precursor da ancestralidade nordestina, que se entrelaça aos seus coirmãos de energia e
sedução. Sempre partindo do coco de roda, praticado na Zona da Mata do Agreste de
Pernambuco, estabelece-se uma conversação do coco com a cabula, o rap, o trap, o
funk, o soul e, pelas mãos de DMeloCoco, também com o noise eletrônico. Mirando o
foco na sonoridade da tradição e da contemporaneidade, e para que tudo se ouça sem
isolamentos, apenas mesclando para multiplicar, DMelo tira do coco qualquer tipo de
ranço anacrônico. Assim é Sambada, um CD criado e desenvolvido a partir de
maracatu, caboclinho, capoeira, ciranda, baião e samba.
Com a percussão pautando os arranjos de guitarra, sanfona, pífano e baixo, os
instrumentistas se expressam em extraordinário congraçamento com os tambores, que
batem e realçam os valores afro-brasileiros – todos imbuídos de uma força tamanha que
faz os corpos estremecerem em consonância!
O álbum inicia com “Canção Para o Povo da Rua”, que nada mais é do que
um chamado coletivo ao congraçamento, à festa e à cidadania cultural. Na sequência,
“Morubá” mistura a batida do trap com atabaques que evocam toques de terreiro
(também em versão audiovisual, lançada junto com o álbum). Logo depois, “Caboclo
de Família” revela a ancestralidade indígena e a sua ligação com a terra que cuida e
onde se habita. “Paranambuca” traz o grave do maracatu, em homenagem explícita ao
nome do estado. Já “Capoeira Odoyá” tem o movimento corporal de defesa, enquanto
a religiosidade prepondera. “Carta Pra Cecy” inicia com o acordeom, enquanto DMelo
declama os versos, plenos de memórias infantis. E “Um Bom Começo” traz o balanço
nordestino para o proscênio, entoado por DMelo, com suingue arretado, apoiado por
sanfona e coro feminino. Por fim, “Lasca Vara” é cereja no bolo: numa levada
instigante, clama ao poder de criação, enquanto seus versos preparam para o gran finale
da sambada de DMeloCoco.
Aquiles Rique Reis
Nossos protetores nunca desistem de nós.
Ficha técnica: Vinícius de Farias: produção; Zé Freire: violão de sete cordas; Iko Brasil:
pífano.
Ouça o álbum:
https://open.spotify.com/album/5RSy4Rb1d61ZztnHUDsMWF?si=-UW4nOglT5OO8_chyQyugw

